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         E SE EU TIVESSE MORRIDO 
     NINGUÉM CHORAVA POR MIM!



            
             O autor sonhou perdido nas matas, enfrentando as mais difíceis situações, porém superando todas elas. No sonho, percebeu que não havia preocupação por parte de ninguém e por isto, ao acordar-se, escreveu este mote em sete sílabas. Aliás, situação como esta somente em sonho poderia acontecer.


Já me vi pelo sertão
sem saber onde eu estava,
comendo, quando encontrava
frutas tombadas no chão;
só escutava o trovão
e o assobio do soim,
num campo de gergelim
estive a noite perdido
- E se eu tivesse morrido
ninguém chorava por mim.

Sofri de uma fera ingrata
perseguição numa gruta,
tive que enfrentar a luta
com meu punhal cor de prata;
depois de uma hora exata
eu consegui lhe dar fim,
e cansado, fiz: Atchim!!!
aí voltou meu sentido
- E se eu tivesse morrido
ninguém chorava por mim!

Cheguei a um riacho cheio,
sem fazer das águas caso,
pensando que fosse raso
tentei passar pelo meio;
a onda me fez de esteio
a um tronco de beijamim,
pelos seus galhos enfim
fui bastante protegido
- E se eu tivesse morrido
ninguém chorava por mim!

Cansado de andar a pé
e ao penetrar num roçado,
peguei um burro peiado,
fiz dele um transporte, até;
era um burro canindé,
velhaco, brabo e ruim,
deu pulo até que no fim
deixou-me ao solo estendido
- E se eu tivesse morrido
ninguém chorava por mim!

Senti na minha chinela
espinhos de arapiraca,
uma cobra jararaca
pegou na minha canela;
eu que sou curado dela
nada tive de ruim,
um besouro de cupim
penetrou no meu ouvido
- E se eu tivesse morrido
ninguém chorava por mim!

Lá encontrei muito gado
que pastava na campina,
um touro da ponta fina
voltou-se para o meu lado;
era um novilho malhado
pintado de surubim;
eu me deitei no capim
e ele se deu por vencido
- E se eu tivesse morrido
ninguém chorava por mim!

Segui nova direção
e cheguei a uma bodega,
um cão quase que me pega
quando abri um cancelão;
um pistoleiro e ladrão
atirou pra me dar fim,
com coragem, sem motim,
defendi-me do bandido
- E se eu tivesse morrido
ninguém chorava por mim!

De tanta angústia e maltrato,
às doze horas do dia,
sofri tremenda agonia
e dormi dentro do mato;
fui visto por um beato
que voltava de um jardim,
deu-me dois chás de alecrim
sem doce, com comprimido
- E se eu tivesse morrido
ninguém chorava por mim!

Cheguei numa moradia
e cumprimentei os presentes,
perguntei por meus parentes
e assim alguém respondia:
Vi alguns com alegria
ontem à noite em um festim,
contou tim-tim por tim-tim
do que tinha acontecido
- E se eu tivesse morrido
ninguém chorava por mim!

Vizinho fez diversão
que até ficou na memória,
meus tios contavam estória
do tempo de Lampião;
até mesmo o meu irmão
não guardou seu bandolim,
só mamãe dizia assim:
Perdi meu filho querido
- E se eu tivesse morrido
ninguém chorava por mim!
Pedro Ernesto Filho
Enviado por Pedro Ernesto Filho em 20/07/2008
Alterado em 21/02/2010


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